Empresa júnior: um caso de sucesso no Brasil

empresa junior

Em um país que passa por uma crise aguda, parece difícil acreditar que alguma coisa vai bem. Para a surpresa de muitos, há um setor em que o Brasil está à frente até das potências europeias: as empresas juniores. De acordo com reportagem da Folha de São Paulo, nós estamos em nada menos do que a liderança mundial. São 311 instituições desse tipo no país computadas em um levantamento do ano passado – contra 296 em todo o continente europeu. A reportagem mostra também que o faturamento não foi nada desprezível: R$ 10 milhões no ano passado, quase o dobro de 2014. Sempre defendi a importância dessa modalidade e o potencial que a multiplicação dessas empresas tem para desenvolver o espírito empreendedor em uma sociedade tão carente de inovação e competitividade. Afinal de contas, você pode se perguntar: por quê? O que são essas empresas e o que elas têm a oferecer? Será um bom sinal que elas estejam crescendo tanto?

Uma empresa júnior, para início de conversa, é sempre uma associação formada por alunos do Ensino Superior. Ela não é uma empresa tradicional, porque presta os mais variados serviços, mas não tem fins lucrativos. O objetivo é desenvolver habilidades dos estudantes antes que eles ingressem no mercado propriamente dito. Para compreender o espírito de quem se lança nessa seara e a natureza da experiência, conversei com presidentes de empresas juniores do Rio de Janeiro e pessoas que já participaram dessas associações.

Gabriel Aleixo Prata, que foi diretor de Projetos da FGV Jr., pontua que, sem dúvidas, é natural enxergar a empresa júnior como uma forma de capacitação prévia e abertura de oportunidades profissionais – afinal, um estudante que trabalha em um projeto de alguma empresa júnior pode despertar o interesse de um eventual cliente e acabar contratado, com uma posição melhor no mercado. Porém, do ponto de vista dos clientes, em sua maioria sofrendo com a conjuntura econômica altamente desfavorável, a empresa júnior tende a oferecer ainda mais atrativos.

Capacitação dos alunos-membros são uma das características das empresas juniores. Na foto, uma capacitação da FGV Jr. (Foto: Divulgação/Facebook)
Capacitação dos alunos-membros são uma das características das empresas juniores. Na foto, uma capacitação da FGV Jr. (Foto: Divulgação/Facebook)

“As empresas juniores não apenas representam uma mão de obra qualificada a custo acessível, mas também trazem possibilidades únicas de inovação em determinados campos, notadamente aqueles ligados a novas formas de gestão, tecnologia, empreendedorismo, etc., uma vez que as rápidas transformações das relações econômicas nos últimos anos são mais facilmente assimiladas pelos jovens do que por consultores tradicionais”, ele frisa.

O presidente da Fluxo Consultoria, Vinícius Muniz, concorda, mas destaca que a grande importância da empresa júnior não está no oferecimento do serviço em si, mas em proporcionar aos estudantes o desenvolvimento de competências que o sistema de ensino encontra carência em abordar nas salas de aula. “O sistema de educação superior no Brasil ainda precisa melhorar, e nós como alunos estamos buscando novas formas de aprendizado e desenvolvimento de forma proativa, em vez de esperar que outras instâncias tragam essas mudanças. ”

Outro presidente, o da Economus (UERJ), Luiz Felipe Negreirosão, se orgulha da marca de liderança mundial, e frisa que as diferentes empresas juniores não são efetivamente concorrentes, mas parceiras: “Quanto mais empresas juniores tivermos, mais próximos estaremos do nosso objetivo: um Brasil mais empreendedor. O incrível trabalho realizado pela Confederação Brasileira das Empresas Juniores (Brasil Júnior) com certeza influencia muito nesse crescimento”.

Felipe Arantes participou da empresa júnior CEMEC, do Ibmec. Hoje, é executivo da própria faculdade. (Foto: Aylson Miranda)
Felipe Arantes participou da empresa júnior CEMEC, do Ibmec. Hoje, é executivo da própria faculdade. (Foto: Aylson Miranda)

Afinal, o que se aprende em uma empresa júnior?

Tudo isso é muito importante; mas, concretamente falando, que habilidades são essas que as empresas juniores permitem desenvolver? Que complementação elas têm a oferecer às salas de aula? Quase todos os entrevistados são unânimes: atuar em uma empresa júnior ajuda a aprimorar a capacidade de trabalho em equipe e a atitude de liderança. Felipe Arantes, que trabalhou no CEMEC (uma empresa júnior do Ibmec focada em mercado de capitais) e é atualmente Supervisor de Relacionamento com Escolas do Ibmec, garante que há uma lista quase inumerável de habilidades que os estudantes podem desenvolver e até descobrir no exercício das tarefas de uma empresa júnior, entre elas a gestão e a apresentação de projetos. Porém, a dinâmica de comportamento e interação entre todos que se dedicam à realização de um trabalho, como se os estudantes se sentissem efetivamente parte de um “time”, representam mesmo o grande diferencial da experiência de atuar nesse setor.

O presidente da Economus acredita que o maior ganho é pessoal: oratória, capacidade de pensamento crítico, relacionamento… “O membro da empresa júnior chega muito mais pronto ao mercado de trabalho do que um aluno que tem como única atividade a frequência nas aulas da Graduação”, garante. Aleixo, que atuou na FGV Jr., reconhece que o nível de exigência e a tolerância ao erro são muito maiores em uma empresa tradicional.

Além disso, como lembra Vinícius Muniz, presidente da Fluxo, existe a necessidade de equilibrar o tempo que o estudante destina às matérias da faculdade com o tempo que destina à empresa, o que tende a não ocorrer na vida normal como trabalhador.  “Por outro lado, sabendo disso, os integrantes buscam se desenvolver de forma muito acelerada, dedicando-se ao seu trabalho para poder aprender o máximo que conseguirem”, salienta. É justamente para que eles se preparem para o ambiente duro do mercado que as empresas juniores existem, afinal.

Inauguração de empresa júnior no Ibmec (Foto: Divulgação/CEI)
Inauguração de empresa júnior no Ibmec (Foto: Divulgação/CEI)

Quem faz a empresa júnior são os estudantes e a universidade

O perfil dos estudantes que participam das empresas juniores é bastante amplo. As áreas que mais se destacam são as de Engenharia, Administração, Economia, Relações Internacionais e Ciências Contábeis. Felipe Arantes, porém, falando de sua experiência na Ibmec Jr., ressalta a multidisciplinaridade da oferta de vagas por lá: “Você tem alunos provenientes de todas as Graduações que oferecemos”. A sustentação financeira das associações, de forma geral, se dá através do retorno da venda dos próprios projetos desenvolvidos pelos alunos, o que torna o desafio ainda mais estimulante.

O Movimento Rio Empreendedor apoia as empresas juniores e incentiva os universitários a participarem delas.
O Movimento Rio Empreendedor apoia as empresas juniores e incentiva os universitários a participarem delas.

Para manter tudo isso em ordem, é claro, o suporte das próprias universidades é fundamental. Nesse aspecto, os entrevistados parecem não ter grandes senões a apontar. “Temos um ótimo relacionamento com a UFRJ”; diz, por exemplo, o presidente da Fluxo. “Sem o apoio dos professores da universidade, não conseguiríamos nos desenvolver. O espaço físico onde fica a sede da Fluxo é fornecido pela universidade”. O presidente da Economus, Luiz Felipe, lembrou também que existe agora um dispositivo legal que ampliou os direitos e deveres das empresas juniores dentro da universidade: a Lei da Empresa Júnior, celebrada em sessão solene no último dia 20 de junho, que assegura a imunidade tributária, o espaço físico e o reconhecimento dos professores orientadores.

Entre 20 e 24 de julho, o Brasil receberá o Junior Enterprise World Conference, um grande encontro em Florianópolis reunindo mais de 4000 jovens universitários de todo o planeta. Os fatos e os números falam por si mesmos. Se o potencial é tão grande e a utilidade é tão notória, o que poderia aumentar ainda mais o sucesso das nossas empresas juniores?

As respostas vão na mesma direção: mais estrutura, uma integração mais efetiva entre as diversas associações, e principalmente, um olhar mais carinhoso do público alvo (normalmente micro e pequenos empresários) dos serviços oferecidos. Luiz Felipe explica: “Muitas empresas juniores ainda sentem dificuldade em conquistar a confiança dos clientes pelo fato de os membros ainda estarem na faculdade e por conta da idade deles. Sempre que temos um espaço na mídia, isso se torna motivo de comemoração. Quanto mais o Movimento Empresa Júnior estiver em evidência, mais projetos as empresas juniores farão, mais jovens estarão nessas iniciativas, mais empreendedores serão auxiliados, e mais pessoas serão preparadas para o mercado de trabalho”.

A calamidade que o Brasil vive hoje tem muito a ver com a falta de iniciativa privada e livre na definição dos nossos rumos, e com a aposta irracional em um modelo sufocante de estatismo avassalador e improdutividade. Tenho certeza de que a multiplicação das empresas juniores, bem como as evidências de que elas compreendem bem a própria missão, são excelentes boas novas para quem tenta enxergar a porta de saída desse cenário.

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